Neurologista.

Os Poemas de Mário Quintana para Mário Birnfeld

- E então você veio até mim?
- É, foi bem assim, mesmo. O que? Acha que eu fiz errado? Quem cuida da cabeça é neurologista, né?
- Sim. De certo modo, é.
- Então... Como resolvemos?
- Olha, nós precisamos de alguns exames, antes.
- Mais exames? Acho que eu passo mais tempo fazendo exame do que tentando resolver o problema. Sério, doutor, isso cansa. Eu acordo, dói. Eu estou tomando café, dói. Eu vou pro trabalho e dói. Eu estudo, dói. Dói o dia inteiro e toda hora. Dói, dói, dói... Aí eu fui no cardiologista e ele falou que a dor no meu coração é problema da cabeça... Aí eu vim aqui e... Dói.
- Hm...
- O que foi? Vai falar que já descobriu o problema? Aham, sei...
- O problema, talvez não, mas acho que você tá no lugar errado.
- Que? Lugar errado, como assim? Meu problema não está na cabeça?
- Sim, mas...
- E quem cuida da cabeça não é neurologista?
- Seu problema está na cabeça, mas não no seu cérebro. Quem cuida do cérebro é neurologista, quem cuida da cabeça é sensato.
- Então onde está ele?
- Na boca. Enquanto você não tirar seu problema da boca, ele não vai te deixar.
- E como eu tiro ele da boca, Doutor?
- E eu é que sei?

Rafael M. Watanabe

Nota do Autor: A imagem que acompanha esse post é um recorte de um Ilustrador – talentoso – que conheço, Salvio. Talvez eu use mais ilustrações, sem a permissão dele, aqui. Por isso essa nota. Outra coisa: caso você não tenha lido a história a qual esta está dando continuação, basta clicar aqui http://bit.ly/bdxgR1 e, bem, ser feliz. Vai deixar as coisas mais claras.


em terça-feira, 16 de novembro de 2010 2 comentários

Sacrifício.

2008_ciao_004-1(Cena do filme CIAO, 2008.)

E você não vai reservar uma palavra a mim. E você não vai me dirigir um único olhar. Nem um gesto. E eu nunca vou conhecer seu toque. E eu nunca terei um pensamento seu, que seja só meu. E você nunca perceberá que eu poderia ter sido o homem da sua vida. Seu homem. E eu nunca serei esse homem.  E eu te verei se desgastando, se perdendo – me perdendo –, em outras pessoas, sem me notar, sem notar a sua grandeza em mim. E as pessoas, incluindo você, me perguntarão se eu estou bem e eu vou sorrir e falar “Nunca estive melhor”, acompanhado de um sorriso aberto, mesmo que torto. E quando eu estiver sozinho e descer ao meu inferno pessoal, me reservarei – se necessário – um pouco de esperança, perseverança, cinco lágrimas e um sorriso seu que eu levarei sempre comigo, no bolso.

Rafael M. Watanabe


em domingo, 7 de novembro de 2010 1 comentários

Cardiologista

Silence_of_Love_PRINT

– Não, um pouco mais pra esquerda, Doutor. Isso, mais pra baixo. Não, pera, calma, um pouco mais pro lado. BEM AÍ, Doutor.
– Aqui?
– É.
– Mas não tem nada aqui.
– Como não?
– Eu já disse, seus exames do coração apresentaram resultados totalmente normais. O problema não é aí, definitivamente.
– Então por que dói tanto, Doutor? Eu tenho certeza que é alguma coisa... Pera, qual o motivo desse suspiro? O que aconteceu?
– Acho que já sei o que é, só isso.
– Sério?! Que bom! O que é?
– O problema está na cabeça. Enquanto você não tirar ele daí, sua dor aqui não vai parar.
– Hm... E como eu tiro ele da minha cabeça?
– Aí eu não sei.
– Como assim, não sabe?
– Desculpe, mas eu sou só cardiologista, né?

Rafael M. Watanabe


em quinta-feira, 4 de novembro de 2010 2 comentários